Um passeio de trem
Silvia Britto
Dormi na
casa da minha irmã, no Engenho de Dentro, e resolvi voltar para casa, na Urca, de trem e
ônibus. Julgando-me muito esperta, esperei até as 10 horas da manhã, para fugir
da hora do rush nos trens. Certamente, às 10 horas, todos já estariam
trabalhando.
O primeiro
susto se deu quando cheguei à estação e a encontrei lotada. Perguntadeira como
sou, logo inteirei-me da situação: os trens estavam com atrasos de 40 minutos
hoje. A razão: só Deus sabe.
Por sorte, o
trem vinha chegando e pensei, metida, que havia dado sorte. Sorte? Eu disse
sorte? Bem, julguem vocês. O trem abriu as portas e eu duvidei da lei da Física
de que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo. Mas
como meus companheiros de estação apressassem-se a entrar no vagão, eu é que
não iria ficar para trás!
Como num
passe de mágica, encontrei-me no centro do vagão. Lógico que não havia lugar
para me segurar. Mas, ei! E daí? A vida é feita de emoções! À minha frente,
havia uma mocinha, que ainda conseguia ser mais baixa do que eu, na ponta dos
pés, tentando segurar na alça de metal que pendia do teto. Atrás, um negão
afrodescendentão, à Seedorf, fazia a segurança do meu bumbum, que quase não
ocupa lugar no espaço, pousando a mão delicadamente no meu também delicado
derrière. Eu nem tinha como reclamar ante tamanha solicitude.
E seguimos
viagem no trem “direto” para a Central, com paradas em São Francisco Xavier e
Silva Freire. O maquinista, talvez supondo a imensa onda de calor humano que
eclodia nos vagões, não se apressou e fez em 40 minutos um percurso que dura
geralmente um pouco mais de 10 minutos. Na parada de Silva Freire, me dei por
feliz de conseguir continuar no vagão rumo a Central. Quase fui levada pela
horda pacífica de trabalhadores atrasados.
Agora eu
tinha um pouco mais de espaço. Minha colega de meio metro partiu e me cedeu seu
lugar na alça do teto. Já nem precisava mais da proteção do afrodescendentão.
Mas ele não arredou pé, solícito em sua proteção à minha lombar. Quando eu achava
que nada poderia ser pior, um dos passageiros resolveu soltar um pum! E foi
daqueles estilo “fffffffffffffffff”! E cheguei à conclusão de que, realmente,
nada é tão ruim que não possa piorar.
Chegando ao
destino, resolvi refrescar-me e tomar um refresco de maracujá, para tentar
acalmar os ânimos. Bebi o líquido amarelo, torcendo para que a minha flora
intestinal não estranhasse muito as suas amiguinhas, que vinham naquela água de
origem duvidosa. Enquanto eu bebia, olhava os rostos daquelas pessoas e pensava
naqueles que ainda tiveram coragem de criticar o movimento pela redução do
preço das passagens, que assolou nosso país nos últimos dias. Como assim, só por causa de 20 centavos? Antes de criticarem, tenho uma sugestão a fazer-lhes. Que tal pegarem vossas
famílias e irem dar um passeio de trem pelos subúrbios do Rio de Janeiro numa
manhã de segunda-feira? A emoção é garantida. Só não garanto que essa seja uma
das melhores. Bon voyage!
Hunf.
ResponderExcluirHehehehehehe! Isso é ciúme ou indignação? Beijinho, Zé.
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