quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Compromisso com a felicidade


Compromisso com a felicidade

Silvia Britto


Felicidade é um sentimento muito particular a cada um de nós. O que me faz feliz pode não fazer o mesmo pelo meu vizinho. Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é e, por isso, o caminho que trilhamos para atingir essa "tal felicidade" é muito pessoal.
A verdade é que há muito já percebi que esse sentimento é uma miragem, um momento fugaz, que serve apenas para contrastar com a tristeza e obrigar-nos  a ter força para seguir pela estrada que a nós foi destinada. Portanto, torna-se infinitamente mais importante o caminho que pode levar-nos à "tal".
Todos acumulamos problemas, diariamente, com os quais devemos lidar, para tornar a nossa existência viável. Sejam questões financeiras, familiares, amorosas, de saúde, de amor próprio, sempre haverá algo a ser resolvido e a dança das cadeiras das prioridades é incessante. Claro que, por vezes, ficamos cansados disso tudo e pensamos que não teremos cacife para continuar no jogo.
Eu, mantendo a essência de mulher intensa e transbordante, não poderia ser diferente. Lido com muitas questões, diariamente, que tentam levar-me a extremos de prazer e dor, num jogo de interesses em que tudo que se quer é encontrar maneiras de passar despercebido pelas armadilhas da vida. Impossível. Tenho muito pelo que chorar e sofrer, mas tenho mais ainda pelo que sorrir. Muitas vezes, choro e rio com o mesmo fato, dependendo do foco que se faça necessário para o momento. Às vezes, as duas pontas do meu viver embaralham-se e fico, qual louca, sorrindo um riso de lágrimas. Bipolar mais do que assumida, mas não saberia agir de forma distinta.
O problema é que, ao usar as poderosas ferramentas do riso e do choro para a mesma situação, acabo estagnando-me numa camisa de forças invisível e não chego a lugar algum. E é nessa hora que o monstro da depressão espreita-me ao longe, esperando uma brecha para cravar suas garras em minha alegria.
Sempre julguei-me inteligente e corajosa nas minhas escolhas. Algumas dessas escolhas têm a mesma proporção da minha coragem, o que não me deixa lastro para o conforto. Viver, mas viver de verdade mesmo, é exatamente sair dessa zona de conforto, coisa que, modéstia à parte, sei fazer com maestria. A acomodação é pior do que a morte prematura. É morte em vida, é vida desprezada, é pecado mortal da alma. Desta vida, só levamos a alma, o que torna imperioso que dela cuidemos com carinho. Nascemos para cuidar da nossa raiz, para cair na estrada, para ficar por um triz. Ousar é preciso para que consigamos da vida o que ela tem de melhor: a liberdade de sermos quem somos e a alegria de viver sem culpas e sem vergonhas.
Se Deus realmente existir, Ele não há de nos querer tristes, cabisbaixos, ignorando o grande presente que nos deu, a VIDA. Não há de ficar feliz de ver-nos desperdiçando nosso tempo com passados que não mais nos pertencem e que apenas serviram para nos mostrar que escolhas fazer em nome da felicidade e do amor. Quererá ver a desenvoltura com que construímos nossos caminhos. Amará nossos sorrisos, ainda mais, se formos autênticos e se tivermos força de enfrentar nossos medos e nossas opções  de cabeça erguida, sem o grande fardo de ser responsável pela felicidade ou tristeza de outrem! Ninguém é responsável pela felicidade de ninguém! Essa é uma melodia que se dança solo, sempre na pista, a espera de alguém que se encaixe ao nosso passo. Fazer o nosso caminho com honra, alegria e sinceridade, é o que Ele espera de nós.
Resta-me apenas a opção de como enfrentar os dragões de duas cabeças que encontro pelo meu caminho. Opto pelo caminho da leveza, do amor, da verdade e da entrega. Meu compromisso é com a felicidade e não com a estagnação. Tento, incansavelmente ficar de frente com minhas dores, não as desprezo. É necessário que as enfrente para que eu possa valorizar a ausência delas. Não ligo se pareço incoerente. Que atire a primeira pedra quem não o é. 
Tenho sim, mil razões para chorar, mas faço uma força danada para não deixar que esses sejam os momentos que regerão a minha vida. Quero poder ninar a minha filha quando estou com ela; brindar com os amigos à sua saúde; agradecer aos irmãos de alma pela sua força. Acima de tudo, quero entregar-me inteira ao meu amor, quero ser completa ao seu lado nos momentos que juntos passarmos. Não quero deixar que minhas inseguranças e incertezas estraguem os deliciosos beijos de amor e as carícias de suas mãos pelo meu corpo. Isso não é jogar os problemas para baixo do tapete, pois pretendo vivê-los um por um e resolvê-los da melhor forma possível, cada um a seu tempo. Enquanto misturo tudo, imaturamente, deixo de viver,  e o que pensei estar resolvendo, na verdade foi apenas uma grande perda de tempo. 
Há momentos em que certos problemas só podem ser resolvidos de forma solitária. E é isso que tento fazer. 
Não vou deixar que nada macule minha alegria de viver e minha positividade. Vou dar a Cesar o que é de Cesar, lutando muito para não misturar as estações. Por isso, digo, já disse e repito, meu único compromisso é com a felicidade. Por ela rio, por ela choro, por ela faço o que for necessário. Fora correntes que nos prendam a passados que não nos cabem mais! Fora incertezas que destroem nosso tesão! Fora manipulações de pessoas que não sabem o que é amar! Que se soltem as amarras do crescimento, tanto nosso como de nossos filhos! Que sejamos amados pelo que somos e não pelo que omitimos ou fingimos viver! A vida é curta, o tempo urge e os beijos não podem parar!

À felicidade!

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Sedução e paixão


Sedução e paixão
Silvia Britto

Sedução...
Sem querer, peguei-me pensando no significado dessa palavra. É a capacidade de encantar ao outro. É o momento em que esforços não são medidos para chegar ao objeto de nosso desejo.
No amor, é um dos mais encantadores momentos, em que doces “nadas” são sussurrados aos nossos ouvidos, fazendo a pele arrepiar. É o momento em que deixamos nossa criança interior vir à tona e reinar quase que absolutamente, solta e feliz. Não há nada mais sedutor do que o carisma de uma criança.
E assim seguimos, felizes, despreocupados, dançando pelas ruas, cantando felizes, descobrindo o prazer que cada pedacinho do corpo do outro nos proporciona. Embriagando-nos de novos cheiros, novos sabores e novas emoções.
Não há como negar que é um momento mágico. Lágrimas brotam aos olhos de quem está seduzido tanto quanto de quem seduz. O mundo para de girar e tudo se concentra em apenas um nome, um rosto, uma boca. E os pés, como em um sonho do qual não se quer acordar, não andam, mas flutuam.

Paixão...
É a emoção quase patológica do amor. Sentimento doloroso, muitas vezes com perda de individualidade, mas que exerce um fascínio absurdo sobre quem por ela é atingido. Ultrapassa todas as barreiras possíveis e imagináveis.Quando completamente correspondida, causa grandiosa felicidade. Dizem que é um sentimento passageiro... Dizem que não há como durar uma eternidade. Como tudo na vida, há o momento de retorno à realidade, onde a paixão cede lugar ao amor e o mundo tende a recuperar seu passo. E tudo fica mais sereno, a calmaria se instala e o coração se aconchega na paz da certeza.

E é aí que começa o meu problema. Não chego a alcançar esse patamar de tranquilidade. Sou intensa. Vivo eternamente enamorada e encantada com a sensação maravilhosa que um “eu te amo” provoca nos meus sentidos. Busco abraços, contatos, cheiros, como se nunca saísse do estágio da paixão e da sedução.
Obviamente, sempre chega o momento em que uma certa paz e certeza instalam-se em algum lugar ao fundo, mas não é isso que me faz arder de vida. Ardo com o inesperado, ou esperado, toque no meu pescoço, que tem o dom de arrepiar cada célula do meu corpo.
Tenho crises de abstinência de beijos, abraços, cafunés, danças no meio da rua, declarações inesperada e deliciosamente fora de hora. Sinto ânsias de encontros! Sou uma eterna apaixonada e sei que tenho que tomar extremo cuidado com esse meu sentimento sob o risco de sentir-me rejeitada ou esquecida. Nem todos nasceram sem esse freio normal e, se seguirem o meu ritmo, acabarão atropelados pelo próprio desejo.
Estou em fase de tentar amadurecer. Fase de tentar entender que cada um tem seu ritmo, independentemente do amor que possa sentir. Tranquilidade não é sinal de desamor ou falta de interesse. O fim da sedução, não significa falta de paixão. Minha tendência é ser eternamente uma adolescente enamorada e, se não tomar muito cuidado com isso, acabo por me machucar ao esperar do outro, coisas que não me podem ser dadas. Há milhares de outros detalhes que impedem que essa paixão e o jogo de sedução estejam sempre no topo da lista das prioridades das pessoas em geral.
Entretanto, faço questão de marcar muito bem a minha posição inconsequente de eterna apaixonada. Luto para dar atenção também aos inevitáveis problemas do dia a dia, mas nunca deixarei que nada interfira no delicioso jogo de sedução, entrega e paixão, tão difíceis de ser alcançados, desacreditado por alguns e invejado por muitos.
Apenas tenho que aprender a me bastar e ficar feliz em sentir o que sinto, independentemente do que o outro possa estar sendo capaz de me dar. A felicidade e plenitude vêm de dentro e nunca devem ser cobradas de quem quer que seja. Cada um dá o que pode e quando pode. Fico muito feliz em apenas sentir o que o outro provoca em mim e tento desligar-me do que me pode ser dado. Dá quem pode e como pode. Cobra quem não sabe amar. E é isso que aprendo mais e mais a cada dia. Apesar da minha carência sem fundamento, não quero cobrar... Quero amar.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

No Maranhão, babaçu abunda


No Maranhão, babaçu abunda
Silvia Britto

Abunda.
Mas não é só o babaçu que abunda.
Abundam carinhos que transpiram família.
Abundam lembranças que choram saudades.
Nada como sentir, novamente, o carinho de pai e mãe através de seus irmãos, que carregam o mesmo sorriso, o mesmo calor, o mesmo tempero. Como o famoso vatapá da Lelete, com gosto de vó Dedé. Lelete, tia querida, que ouso dizer, herdou a missão de ser minha mãe do coração, coisa que ela faz de forma generosa e inteira, com carinho e cobranças nas horas certas, coisa que só as mães sabem fazer. Levanta-se cedo, vai ao mercado, cozinha os caranguejos ainda vivos, zelando por seu frescor. Abraça, com muito orgulho, seus netos e sempre sobra um pedaço desse carinho para quem tiver a honra de por ela ser encantado. E toma-lhe cerveja, que os Britto não podem parar!
Lembranças intensas brotam-me pelos olhos, ao deparar-me, mais uma vez, com a casa em que nasci, na querida São Pantaleão, defronte à casa da Dona Glória, com seus filhos amados, que dividiam comigo a deliciosa tarefa de brincar pelas calçadas da rua. Como num sonho, nossas vozes infantis me vêm ao coração e vejo-me gargalhando, pulando elástico com as meninas Lago, admirando a beleza idêntica das lindas gêmeas, Luísa e Heloísa, da casa vizinha, trocando beijos roubados com o Beto, soltando papagaio com Pedro, Paulo e Raimundinho pelos telhados das casas, enquanto vovó Laíde preparava o mais gostoso arroz de toucinho que já comi, empatado apenas com o do Tio Moza, que provou haver herdado seus dotes culinários.
A casa agora, abriga meu tio, Mestre Patinho, uma das figuras mais respeitadas em São Luís, pela sua arte de rua, na capoeira e também pelo seu jeito despojado de valores que nos são ditos como "normais". Patinho é xamã. Para quem não sabe, o xamanismo é uma das mais antigas práticas espirituais, médicas e filosóficas da humanidade. Essa honra lhe foi conferida durante sua convivência com índios no alto Xingu. Patinho não anda. Ele flutua pela vida com valores próprios e despojados de materialidade. É amado, respeitado e admirado por seus filhos e netos de uma forma que faz doer o coração. Agora, também admirado por mim, que consego enxergá-lo com os olhos de uma mulher aberta às incoerências e falta de nexo da vida.
E o passeio pelo tempo e pelas mãos que ajudaram a moldar a minha essência veio fortificar o meu sentimento de guerreira, de moleca, de lunática, eterna criança e nordestina filha da terra e do mar da minha querida Ilha do Amor. Que apelido sugestivo, não acham? Ilha do Amor! Voltei revigorada pela certeza de pertencer. Sou bandida, sou solta na vida, mas tenho ainda meu porto seguro, com suas lindas histórias e passagens de vida de um tempo que não volta mais, mas nunca  morrerá.
Peço a benção aos meus queridos Britto, Lelete, Kêta e Catiba, meu padrinho lindo. Benção aos Ramos. Sua benção Mestre Patinho. Bença Moza, meu eterno Gato Louro, gaiato como ele só e o maior contador de casos de todos os tempos!
Volto ao mundo presente com a certeza de que essa ideia de passado e futuro são apenas miragens que a mente cria para não viver em saudade pelo que passou e ansiedade pelo que ainda virá. Na verdade, o passado é tão presente quanto o futuro e é dele que ganhamos a força e a energia necessárias para continuar agregando pessoas queridas e seguir construindo nosso futuro que, um dia, também deixará lembranças.
Salve São Luis do Maranhão!