E o tempo passa...
Silvia
Britto
Fevereiro
2023
Em 1963, a
pequena bebê escorregava do ventre materno para o mundo. Era uma quarta-feira-de-cinzas,
4 horas da manhã, bem a tempo de ouvir a última música do último baile de
Carnaval. Provavelmente, Bandeira Branca, pois é a cor da bandeira que carrega
ao longo da estrada desde então. Sem entender muito o que acontecia ao seu
redor, ela chorava... E ria.
Em 1973, a
menina estudiosa seguia rumo à escola, antes até do sol nascer, para, com isso,
conquistar o primeiro lugar na fila de alunos que seguiriam à sala de aula.
Recém-chegada do Maranhão, tentava fazer parte daquele tal de Rio de Janeiro,
enfrentando seus primeiros preconceitos pelo fato de ser nordestina, mas
marcando seu lugar como melhor aluna da turma e, com a barriga vazia de café da
manhã e o coração cheio de medos. Sem entender muito o que acontecia ao seu
redor, ela chorava... E ria.
Em 1983, a
jovem deslumbrava-se com o encontro do primeiro amor. Achava que não poderia
ser mais feliz. Cursava a faculdade de Odontologia, embora gostasse mesmo era
das Letras. O mundo parecia muito atraente, pedindo para ser desbravado.
Continuavam os preconceitos pela origem mais humilde, pela falta de religião,
pela mistura de raças na sua pele. Mas ela seguia, com toda a sua coragem e
vontade de ser feliz, em uma eterna busca pela tão falada felicidade. O
universo era totalmente desconhecido e ela só sabia que tinha que correr atrás,
sabe-se lá do quê! Sem entender muito o que acontecia ao seu redor, ela
chorava... E ria.
Em 1993, a
jovem mulher havia ganhado o mundo. Morava na Inglaterra. Passeava pela
História do mundo. Desbravava uma nova cultura e sentia-se muito perdida quanto
à profissão. Difícil ganhar dinheiro com o que se gosta! Já havia perdido a
ilusão da independência financeira que planejara alcançar aos 25 anos. E, num
baile de máscaras, encantava os ingleses com sua alegria e seu rebolado, ao
completar seus 30 anos. Sem entender muito o que acontecia ao seu redor, ela chorava...
E ria.
Em 2003,
rompera os limites do segundo milênio! Tornara-se mãe de outra menina e nunca
mais estaria só. O casamento, de quase 30 anos, mostrava sinais de cansaço. A
tal felicidade não era para sempre, percebeu. A paixão dava lugar a um
sentimento de amizade, que não justificava mais dividir uma vida e sonhos de
futuro. A profissão também não engrenava. Sem entender muito o que acontecia ao
seu redor, ela chorava... E ria.
Em 2013, a
jovem dera lugar à mulher madura, já divorciada e em busca, novamente da tal
felicidade. Estava no fim de mais um relacionamento, já aceitando que a
felicidade se dá em momentos e não dura para sempre. O bacana de tudo era o
caminho que se trilha em busca desses pequenos momentos de prazer. Seguia mais
leve, mais segura, mas ainda perdida financeiramente, o que tentava resolver
dedicando-se aos concursos públicos. A vida tem ciclos e só precisamos aprender
a hora de pular para o próximo. Sem entender muito o que acontecia ao seu
redor, ela chorava... E ria.
Hoje, em
2023, a jovem senhora não corre mais atrás de sonhos irreais, preferindo
realizar as coisas possíveis. Tornou-se estável financeiramente. Não busca mais
uma felicidade paradisíaca, mas uma certa paz, especialmente consigo mesma,
para conseguir também espalhar um pouco de esperança por onde anda. A vida
amornou. Mas ela até acha agradável essa desaceleração. Há que se poupar
energia para as coisas que realmente são importantes na vida: saúde, justiça e
honestidade. Já entende um pouco mais do que acontece ao seu redor, mas ainda
chora... E ri.
Nunca teve
problemas com a idade: se os 60 são os novos 50, os 50 são os novos 40, e assim
por diante, então, está completando os novos 20, que combinam mais com sua
idade mental e disponibilidade para amar. E segue por aí, talvez voltando de 5
em 5 anos, pois de 10 em 10 tá ficando um pouco puxado, para continuar
documentando esses ciclos, rsrs. Espera estar por aqui em 2033 e com muita
sorte e sabedoria, quem sabe até em 2043! E, com certeza, continuará
chorando... E rindo!