terça-feira, 30 de setembro de 2014

O que há para hoje



O que há para hoje
Silvia Britto

Há muito que não escrevo e, por isso mesmo, sinto as emoções acumularem-se de forma preguiçosa e perigosa dentro da minha fiel e anárquica cabeça inquieta.
Tenho sido vítima de uma acomodação infértil e nada generosa na arte de doar-me. Tenho andado egoísta, e ensimesmada, voltada apenas para meus prazeres e dores de mulher atrevida, esquecendo-me de que estou longe de ser o centro do Universo.
Quantas vezes mais terei que deixar de apreciar um belo por de sol para descobrir que ele não mais repetir-se-á? Quantos luares terei ainda que desdenhar para descobrir o quão tola e pequena eu ando sendo?
É certo que ando pela vida aberta a tudo que me possa fazer sorrir ou chorar, mas ando esquecendo-me de que a vida também é repleta de situações que fogem ao meu controle.
Para que ter medo de momentos que podem não chegar? Ou, pelo outro lado da moeda, por que fazer planos de contos de fadas se as pontes podem partir-se antes de eu chegar aos castelos?
Da vida, quero apenas o presente. E é assim que tem que ser. Que o passado me encha de experiência e sabedoria para viver o hoje e pare de me atormentar com situações sobre as quais eu não tenho mais o poder de evitar.
Que eu seja suficientemente sábia para não transferir o passado ao futuro, que pode nem chegar para mim. Afinal, o futuro é apenas uma miragem e o passado uma lembrança, como se fossem sonhos indomáveis e inalcançáveis.
O que nos resta, de concreto, é apenas o presente. Por isso, que eu tenha a sabedoria dos alcoólatras anônimos de viver um dia de cada vez, da melhor forma que puder. Que meus sonhos sejam passíveis de concretizarem-se daqui a uma hora e não daqui a dois dias, fazendo com que minhas inseguranças e medos não encontrem eco em meu coração.
Quero muito conseguir concentrar-me apenas na felicidade de poder assistir ao por do sol tomando um café quentinho nas tardes de inverno. Sozinha ou acompanhada... Ou melhor, sempre acompanhada da pessoa a quem mais devo amar neste mundo: eu mesma!
Que o meu amor próprio e o orgulho de ser quem sou nunca me abandonem e que seja sempre esse amor que me guie ao encontro do que a vida tem em estoque para mim.
Se nessa vida cada um faz o que quer, cumpre e descumpre tratos de acordo com seus instintos e necessidades, por que não posso eu entender que é isso que nos torna humanos e ser também capaz de aceitar que a vida é um jogo de acertos e erros que não dependem apenas de nós para mudar o nosso prumo?
A vida é isso, um jogo de azar.Ganham aqueles que não se incomodam de perder, se é que dá para me entender. Perdedores, são aqueles que não aceitam ou não entendem que tudo pode apenas ser uma grande miragem. Como miragem, deve ser reservada ao aqui e ao agora. Deve ter apenas um soberano a resolver a hora de sonhar e acordar. Essa resolução deve caber apenas a nós mesmos. Sempre. Sem contar com o amor ou mudança de humor de outrem.
Ser feliz e amar a mim mesma acima de tudo. É o que há para hoje.

Nenhum comentário:

Postar um comentário