domingo, 13 de julho de 2014

O anjo da Lua e a sereia do Mar


O anjo da Lua e a sereia do Mar
Silvia Britto

Hoje eu fui acordada por um anjo prateado. Mal dei por mim, escutei sua voz forte e quente sussurrando aos meus ouvidos:

-"Acorda, amor! Bom dia, amor".

Abri os olhos devagarinho e comecei a sonhar. Ele estava ali, lindo e prateado. Com certeza, seduziu a Lua e essa esparramou sobre ele sua poeira de prata.
Estava lindo, sorrindo, feliz por ter em seus braços sua sereia ardente e cheia de paixão pelo despertar inesperado.
Em meu sonho acordada, devagarinho fui me deixando envolver pelo seu cheiro, seu calor e sua sede de me amar. Em poucos segundos, de dois, éramos um. E o mundo explodiu em gozo. E a vida explodiu em amor.
Éramos, mais uma vez, crianças travessas, abusadas, petulantes, a desafiar o espaço que nos separa, entre a Lua e o Mar. Mas somos desobedientes às coisas que nos tirem o prazer de nos termos plenos e insaciáveis. Deixamo-nos ser movidos apenas pela delícia de sermos quem somos quando estamos juntos.
E ali ficamos, a sereia menina e o anjo garboso, jurando amor eterno e tomando café com gosto de hortelã.
Quisera eu que o sonho não acabasse jamais. Quisera eu perder-me no tempo e fazer com que a Lua e o Mar nunca mais tivessem que ceder lugar ao mundo ditador de regras, horários e esperas da realidade.
Mas o Sol surgiu e meu instinto de sereia deixou-se levar pelo desejo de entregar-me ao Mar. Meu anjo pediu então ao Sol que cuidasse de mim e que me emprestasse um pouco do seu calor, fazendo com que a pele morena de sereia ganhasse o tom dourado, que só o Sol sabe emprestar-lhe.
Subi nas asas do anjo, que me levou ao Mar, numa linda e curta viagem, repleta de risos, juras de amor e cumplicidade incondicional. Deixou-me na beira da praia e partiu, prometendo voltar sempre para preencher meus sonhos com sua luz prateada.
E ali eu fiquei, na beira da praia. Fechei os olhos por alguns segundos e, quando os abri novamente, o anjo havia partido. Partiu do meu sonho, mas ficou tatuado em meu coração. Levei-o em meu peito e juntos brincamos com as ondas, corremos na areia úmida e cantarolamos as canções que vinham de algum lugar, trazidas pelo vento.
Da mesma forma com que abri os olhos e comecei a sonhar, agora os fecho para o sonho e tento fazer minha alma dormir sossegada enquanto espero o tempo passar. O sono, como dizia minha avó, é o maior aliado para acelerar as exigências do tempo. E aqui fico a esperar por meu anjo, esperando que a Lua, enfim, mergulhe para sempre no meu Mar.
A sereia, agora, descansa no mar dos meus sonhos, guarda o longo suspiro, sozinha, enquanto cochila no manto do tempo, aguardando o tão esperado momento em que o anjo pousará, interrompendo a sua solidão forçada e lhe dirá:

-"Acorda, amor... Vim te buscar".

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