A cólera do anjo
Silvia Britto
Antes de
começar a escrever este texto, sinto-me na obrigação de dar um aviso aos meus
incautos amigos, sempre acostumados a ler apenas o meu lado positivo e de bem
com a vida. Agradeço por isso e concordo que assim levo noventa e cinco por
cento da minha existência. Sou um anjo, pois todos o somos, do bem. Mas não
posso negar os cinco por cento restantes, que me tornam também um ser humano,
de carne, ossos e sentimentos sórdidos e pequenos. Aviso que, se não quiserem
ver a feiúra e a humanidade desta mulher,
abandonem agora a leitura.
Sempre fui
um pouco bruxa. Vidente de comportamentos falsos. Anjo e demônio.
Tenho umas
sensações estranhas e, quando vejo, algo de podre realmente estava acontecendo.
E é esse o meu atual momento. Sinto o ar pesar a minha volta, o tempo atrasar, o
peito apertar. Estou assim há coisa de duas semanas. Há uma ameaça que paira
sobre mim. É algo já antes experimentado por meu coração. Portanto, um antigo
inimigo, novamente a mostrar-me as garras.
Maluca!
Muitos devem estar pensando. Mentirosa! Alguns devem estar duvidadndo. Mas,
sinceramente, não me interessa. Não tenho compromissos com falsas verdades ou
comportamentos coerentes. E como sempre faço quando o coração aperta, escrevo.
Tenho a
sensação de que, ao passarem para o papel, as energias negativas desgrudam um
pouco de mim. Triste mesmo, é quando elas vêm de pessoas que dizem nos querer
bem mas que, na sua sórdida mesquinhez, mentem e estupram a nossa boa vontade.
Sempre me
questiono o porquê de eu estar atraindo tanto esse tipo de gente. Certamente, o
problema há de ser meu. Mas é que sempre tento colocar as coisas em diferentes
ângulos de análise. Penso que os mentirosos são os que sempre acabam mais infelizes do que eu. E me comovo por
eles. Tento resgatá-los do seu próprio desamor. Idiotice? Talvez. Mas já disse,
não tenho compromisso com coerência.
Entretanto,
por mais que não pareça, até minha paciência chega ao fim. Não sou de desistir
de nada. Tampouco de fugir da raia. Mas quando peço, perdôo, relevo e sou
novamente traída, não me resta nenhuma alternativa a não ser pular do barco.
Estou sentindo que minha tolerância com a mentira e a falta de lealdade está
por um triz.
Portanto,
meus queridos, preparem-se. Acho que muito em breve estarei por aí, com a
etiqueta de maluca, paranóica, descontrolada e infantil colada com cuspe na
minha testa. Lá vai a louca! Aquela que acredita no amor e na cumplicidade. Lá
vai a doida, a vagar solitária, estrada afora, em busca de sinceridade e lealdade.
Mas eu não
vou nem ligar. Antes só do que mal apaixonada, do que mal retribuída. O que uns
leem como baixa autoestima eu traduzo por amor próprio. Afinal, para dançar e
ser feliz, preciso, principalmente, das minhas pernas e do meu sorriso.
Os
mentirosos e enganadores, me perdoem a sinceridade, que se fodam em baforadas
de fumaça preta e mortal. E continuem marcando passo, de mãos dadas com um
passado infrutífero, posto que já teve seu tempo de reinar e já deu os frutos
que houvera de dar. Mortos-vivos covardes! Assassinos do próprio presente e
descrentes de um lindo futuro.
Sorry. Eu avisei.
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