domingo, 23 de junho de 2013

A felicidade dita suas regras

Este texto eu escrevi já faz algum tempo. Mas eles são assim, rebeldes. Às vezes pulam em meu colo e não sossegam enquanto não se veem na tela. Esse veio depois de um sonho em uma noite desconfortável. Quase que o renomeei para "Um dia, num verão". Mas resolvi deixar o título original. Meus textos não gostam de retoques e relançamentos. Desaforados, já disse! E aí vai ele.

 A felicidade dita suas regras
Silvia Britto

Concordo que é muito atrevimento vir aqui escrever sobre felicidade bem no meio do inferno astral desta inveterada nativa de Peixes. Mas atrevimento sempre foi uma das minhas mais fortes características. D. Maria José não poupava comentários ao me chamar de menina atrevida, petulante e destemida. Tentou corrigir-me... Quá! Menina danada de  teimosa!
Acordei hoje com o coração apertado e pronto para explodir à menor provocação. Acho que teve a ver com um sonho muito doido que tive. Um dia eu conto. Muito bizarro para ser resumido.

Para relaxar, resolvi ir à praia aproveitar o último dia de horário de verão. Como sempre, segui com meus fones descansando em meus ouvidos enquanto a rádio me surpreendia com seu repertório do dia. Adoro rádio. Gosto de ser surpreendida pelas suas escolhas musicais. Parecia que um complô havia se formado contra mim. Cada música que tocava era mais linda do que a outra. Letras lindas, cheias de significado e com uma carência enorme de destinatários a quem eu pudesse enviá-las. As lágrimas corriam soltas.

Chegando à praia, larguei a tralha toda na areia e fui sentir o abraço do mar em um mergulho para diluir o salgado das minhas lágrimas. Estava frio, o que me impediu de entregar-me totalmente a esse prazer reconfortante. Dei um rápido mergulho e sentei-me à beira da água. Fiquei ali apreciando aquele vai e vem de água gelada enquanto pensava sobre a tristeza que sentia.

De repente comecei a me sentir pequena diante daquela imensidão de azul que se estendia à minha frente e um sentimento quente de paz me invadiu. Dei-me conta de quão sem noção eu era por considerar-me infeliz. Como alguém que podia testemunhar  tamanha beleza poderia ser infeliz?

Tentei mudar o nome do sentimento.

Solidão? Imediatamente os sorrisos de vários amigos queridos me vieram à lembrança. Tristeza? Como alguém que ama sorrir e dançar pode considerar-se triste? Insignificância? Não creio... Sinto que estabeleço uma relação intensa com todos que cruzam o meu caminho, por menor que seja o instante... Por exemplo, há dois dias virei amiga de infância de um anjinho paulista de 5 anos que veio ao Rio passar o Carnaval. Nosso encontro foi na mureta da Urca que dá para o mar. Eu com uma cerveja e ela com um pirulito de morango. Dedicamos longos minutos à árdua tarefa de tomar conta de uma família de ratazanas que passeavam livremente pelas pedras molhadas de mar... Carol... Linda menina... Chorou quando nos despedimos...

Então me dei conta que reclamava de barriga cheia. Não sou infeliz, nem só, nem triste e muito menos insignificante. Esse aperto no coração também pode ser chamado de felicidade. É a "felicidade triste"! Haha! Até consigo ver o rosto de um amigo muito querido dizendo: "Você é estranha!", com o que minha filha parece concordar. Ele também me diz que a felicidade é um luxo. 
Não concordo. A felicidade é o nosso feijão com arroz, nosso copo de água gelado quando estamos com sede, o abraço quente de um amigo quando estamos carentes, a música linda que flutua no ar, os tons de verde que se misturam nas árvores... Enfim, é só olhar em volta! O que é um luxo é o momento em que essa felicidade é tão intensa que transborda sob a forma de lágrimas,  o orgasmo da felicidade.

Ser feliz é ser capaz de chorar de alegria e sorrir da tristeza. É se acabar de chorar ouvindo música domingo à tarde. É poder ser livre, petulante e gaiata. É conseguir reconhecer os anjos que cruzam nosso caminho...
Tenho que reconhecer: sou boa nisso!

Enquanto me deixava invadir por esses pensamentos revolucionários, chegou-me à mão uma conchinha e imediatamente a acolhi como um sinal divino de que a felicidade era palpável e estava em minhas mãos. Segurei meu talismã com muito carinho e já sei seu endereço. Alguém que merece saber que a felicidade não é um luxo, que é palpável e que se encontra perenemente nas pequenas coisas como essa conchinha que se entregou descaradamente para mim. É só estender a mão e pegar.

Com o reforço dessa certeza, levantei, sacudi a "areia", dei a volta por cima e fui caminhar. Em uma das mãos, o rádio; na outra, a concha. Ao meu lado direito, minha sombra, companheira incansável, prova de que o sol me acompanha; ao esquerdo, o mar sempre pronto para me abraçar e envolver. E dentro do peito, Deus, que nada mais é do que tudo isso junto e misturado.

E a gente vai levando de teimoso e de pirraça e de petulância e de atrevimento e de destemor e de vontade de ser feliz. Simples assim.

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