sexta-feira, 17 de maio de 2013

Uma mãe como todas as outras

                       

                            Uma mãe como todas as outras

Silvia Britto


Era miúda, magra, mestiça e caminhava como se o peso de 30 anos fossem um fardo gigante a ser carregado sobre os ombros.
Andava qual inseto, sem ser notada. Mas era assim que queria. De brilho, só os olhos tristes.
Mão solteira de filho único.O pai da criança, já abandonada no ventre infantil, depois de tirar-lhe a pureza e os sonhos, sumiu morro abaixo, negro do mundo. 
A família rejeitou-a. Culpava-lhe por ter acreditado no amor. Deveria, aos quatorze anos de idade, já conhecer as mazelas da vida. 
Pagou por crer na felicidade, por amar e por ser capaz de entregar-se à paixão.
De seu, apenas o filho, Percy(valdo), adolescente de lá seus 16 anos a quem criara com um trabalho duro.
Um trabalho que se encarregou de roubar-lhe os últimos traços do que restou de sua mocidade.
Dedicara-se a esse filho como se dependesse dele a sua razão de viver. 
Deu escola, meiguice e alimento para o corpo e para a alma. O filho era seu mundo.
Um dia, Percy aparece em casa com um amigo, de idade parecida, a quem pretendia ajudar com a Matemática.
Ficou tarde. O amigo poderia pernoitar até que o dia lhe desse segurança para voltar a sua casa?
Claro. Ela sabia dos perigos da noite escura.
Pelos meados da madrugada, pareceu-lhe escutar gemidos familiares vindos do quarto do filho. 
Pareceu-lhe  por um momento voltar no tempo, ao tempo em que ainda havia pureza em seu coração.
Pela fresta da porta, viu o filho a gemer de prazer enquanto recebia carinhos ousados do amigo.
Reagiu correndo a esconder-se embaixo das cobertas usadas, na cama doada pela patroa.
E chorou. Como há muito não chorava. 
Teve medo pelo preconceito que aguardava o filho. O mesmo que a desamparara anos atrás.
Chorou até ficar vazia, oca de sentimentos. Colocara-os todos para fora. Era hora de rearrumá-los.
O dia raiou, o amigo se foi, e com Percy, ela só ficou.
Olhou bem fundo nos olhos do filho e perguntou-lhe: "Você está feliz?"
Ele acabrunhou-se, abaixou os olhos antes de fitar os da mãe com toda coragem que possuía e respondeu entre corajoso e inocente: "Muito".
Era o que ela queria ouvir. E sorriu, riu, gargalhou como há muito também não fazia. Estava finalmente liberta.
O titubeio tímido do filho mostrou-lhe que nem tudo estava perdido. Havia esperança. Dessa vez seria diferente. 
Ele teria a chance que dela fora roubada, de seguir acreditando, de tentar ser feliz.
E orgulhou-se de si mesma. Não falhara. Enfim libertara-se do peso da culpa da paixão.
O filho e ela estavam livres para lutar juntos contra o preconceito dos que invejam os que ousam sonhar.



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